Apesar da excelente série, autor tem muito mais a oferecer.
Em 10 de Outubro de 2015, o canal BBC nos presentou com a adaptação para as TVs da série de livros As Crônicas Saxônicas, de Bernard Cornwell. Nela, acompanhamos um orfão saxão, Uhtred, que vê sua família e terra natal serem trucidadas por invasores vikings, passando então a ser criado pelo líder do exército invasor, Ragnar. O título para as TVs ficou o mesmo do primeiro livro, O Último Reino.
Conforme a série foi acumulando audiência, despertou a atenção de ninguém menos que a Netflix, que co-produziu as segundas e terceiras temporadas e criou uma legião de fãs. Ao final de 2018, já temos a confirmação de uma quarta temporada.
Naturalmente, muitos fãs buscam além do audiovisual e vão atrás da história original, nos livros, que aliás está muito bem adaptada e apresenta poucos detalhes a mais não aproveitados na série. Mas será que Bernard Cornwell é somente "As Crônicas Saxônicas"? Nas próximas linhas dou um resumo das principais obras do autor, e quais são minhas preferidas, já que foram as que mais impactaram a minha vida literária.
Wyrd bið ful aræd. Espero que gostem
As Crônicas de Arthur
A série de livros que fez de Bernard Cornwell um autor famoso mundialmente não pode ficar de fora dessa lista. Nela, o autor se baseia em descobertas arqueológicas modernas para criar uma história muito mais realista e sangrenta sobre o possível cavaleiro e líder militar Arthur, embasada na história real da Grã-Bretanha da época. Tudo isso sob a narrativa de um dos únicos personagens fictícios, chamado Derfel (pronuncia-se Dervel - depois de matar aula para ler e reler essa saga, nunca esquecerei da nota do autor ensinando a pronuncia correta do nome.).
A riqueza de detalhes e a pesquisa histórica do autor são impressionantes. Dou especial destaque à sua capacidade de descrever batalhas - característica pelo qual ficou famoso e é constante em todos os seus livros. Há pinceladas leves em magia (como falar sobre Arthur, Merlin e Excalibur sem mencionar magia pelo menos uma vez?) e muita informação interessante sobre o druidismo, representado pelo humor sarcástico de Merlin, e sobre o conflito com o crescente cristianismo, que avançava a passos largos na região.
Uma coisa que não suporto nos cristãos é sua admiração pela humildade. Imagine transformar a humildade numa virtude! Humildade! Você consegue imaginar um céu cheio somente de humildes? Que ideia pavorosa! A comida ficaria fria enquanto todo mundo ia passando os pratos uns para os outros. A humildade não é boa, Derfel. A raiva e o egoísmo são as qualidades que fazem o mundo marchar. - Merlin, O Rei do Inverno
As notas do autor, no final de cada um dos livros, também são um show a parte. Nelas, ele detalha com mais calma o seu processo de pesquisa e suas tomadas de decisão em cima de fatos que de fato ocorreram, e fatos que foram criados pelo mesmo - aliás, as ponderações finais da grande maioria dos livros de Cornwell são sempre uma experiência extra e muito bem vinda.
Nota: 10/10 - Não existem falhas nessa saga. Não a toa, tenho meu Rei do Inverno autografado pelo autor e sua leitura marcou para sempre minha vida.
Mas o destino, como Merlin sempre nos ensinava, é inexorável. A vida é uma brincadeira dos Deuses, costumava dizer Merlim, e não existe justiça. Você precisa aprender a rir, disse-me ele uma vez, ou então vai simplesmente chorar até morrer. - Derfel, O Rei do Inverno
A Busca do Graal
É impossível ler A Busca do Graal e não querer sair por aí atirando um arco e flecha. A história é sobre um arqueiro chamado Thomas na época da guerra dos Cem Anos, que se envolve em uma busca pelo que ele acredita ser o verdadeiro Graal das histórias bíblicas.
Completamente recheado de batalhas e figuras históricas da época, os arqueiros ingleses eram os verdadeiros bad-ass dos campos de batalha, dizimando exércitos franceses (e escoceses) que se encontravam em maior número. O feito só era possível porque a flecha conseguia voar por uma boa distância e acertar o alvo com impacto suficiente para perfurar até a melhor das armaduras. A grande maioria das cargas de cavalaria sofriam graves baixas e perdiam velocidade antes de alcançar o exército inglês, enquanto que soldados a pé raramente sobreviviam a uma saraivada de flechas. Naturalmente, só na Inglaterra havia a cultura de treinar arquearia desde muito jovem, já que não era uma arma fácil de se aprender pela força física necessária para tensionar a corda e lançar a flecha com potência suficiente.
Lembre-se, disse a si mesmo, lembre-se de tudo que já lhe foi ensinado. Um arqueiro não mira, ele mata. Está tudo na cabeça, nos braços, nos olhos, e matar um homem não é diferente de matar uma corça. Puxar e soltar, era só isso, e era por isso que tinha treinado por mais de dez anos, para que o ato de puxar e soltar se tornasse tão natural quanto respirar e tão fluente quanto a água que corria de uma nascente. - O Arqueiro
Cornwell novamente está impecável na descrição de batalhas e nos efeitos devastadores que os arqueiros provocavam nos seus inimigos. Além disso, existe o excelente arco da Santa Iquisição da Igreja Católica, com algumas descrições dos métodos e torturas utilizados na época, além da perseguição criminosa aos considerados hereges.
Aliás, essa é outra constante do autor: vários livros tem um tom bastante hostil a elementos cristãos da época, até porque são retratados em épocas menos civilizadas e um pouco mais bárbaras. Não é difícil ver personagens que são padres ou bispos fanáticos (Uhtred que o diga), mas o autor normalmente compensa com alguns bons cristãos e cristãs, portanto dê um pouco de paciência se você for mais sensível a esse tipo de assunto.
Nota: 9/10 - Perde um pouco o ritmo na parte do Graal em si, mas é uma saga genial. Também a reli várias vezes na adolescência.